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Vigésima sétima noite

Written by: Hans Christian Andersen

“ Em meu passeio noturno parei para dar uma espiadela em uma cidade da China“ , disse a Lua. “Meus raios passaram a iluminar paredes nuas desenhando as ruas. Havia portas, mas pareciam todas trancadas. Uma curiosidade tomou conta de mim: por que os chineses preocupam-se mais com o que está do lado de fora e não com o que está do lado de dentro? Será mesmo assim? As janelas das casas eram todas cobertas com persianas feitas de ripas muito fininhas, ao contrário, as janelas dos templos não eram cobertas. Por uma delas pude ver uma luz muito fraca. Assim mesmo, dava para ver o interior do templo. Encantei-me com a diferente decoração do ambiente. As gravuras estavam espalhadas por todos os lados de cima a baixo nas paredes. Eram de um intenso colorido emolduradas em dourado. Elas contavam uma história: as grandes aventuras dos deuses durante o tempo em que estiveram na terra. Em cada nicho havia uma estátua, algumas vezes difíceis de serem vistas pois ficavam escondidas pelas bandeiras coloridas que pendiam do teto. Todos os ídolos eram feitos de latão. A sua frente bacias com água benta, flores e velas acesas. No altar principal imponente e sagrado estava Fô, o deus supremo, vestido de amarelo, cor sagrada. A seus pés um jovem monge sentado meditava e parecia completamente absorto em suas preces. Mas, entre uma prece e outra, ele se distraiu e começou a pensar em assuntos aqui da terra.. Isso não durou muito tempo. Envergonhado de seu deslize, abaixou a cabeça e continuou a rezar. Pobre Soui-Hong! O que passava por sua cabeça? Seria acaso algum tipo de trabalho em um pequeno jardim escondido atrás dos muros? Ocupar-se desse jardim teria sido mais agradável do que cuidar das velas do templo? Ou pensava em uma mesa farta na qual poderia empanturrar-se? Que ousadia! Poderia ser condenado à morte por tal pensamento pelo Imperador Celestial! Ainda em uma viagem pelos mares???!!! Pobre Soui-Hong, nada disso passava pela sua cabeça. O que se escondia por detrás daquele olhar e coração pensante, jovem e sonhador, eram tão somente pensamentos comuns. Qual seria seu pecado então? Apenas o de ter desviado sua atenção e sua concentração de um lugar de reflexão. Seria somente isso mesmo? Certamente que não, seus pensamentos tinham corrido para um lugar longe dali, com um alpendre belo e florido onde uma bela jovenzinha estava sentada. Pu tinha os pés apertados por tamancos, mas dor maior era a que seu coração sentia. A sua frente uma bacia com peixes dourados retinham seu olhar. Com uma varinha fazia borbulhar a água. Ela estava ali, também perdida em seus pensamentos. Pu poderia estar pensando que aqueles belos peixinhos poderiam estar mais felizes se livres. Pu sabia o que significava a falta de liberdade. Eu a conhecia bem e sabia que seus pensamentos também haviam voado, para o outro lado da cidade, para aquele templo. O pensamento de ambos poderiam até ser puros, mas não eram de modo algum apropriados, não pertenciam ao mundo sagrado... Pobre Pu! Pobre Soui-Hong! Os pensamentos terrenos de ambos se cruzaram, mas entre eles meus raios frios os separava como um golpe de espada de um Querubim.”

© Todos os direitos reservados a H.C Andersen Institutte ®

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