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Décima sexta noite

Written by: Hans Christian Andersen

Décima sexta noite.
"Eu conheço um Polichinelo", disse a lua, "o público aplaude quando o vê; Qualquer movimento feito por ele se torna cômico. A simples presença dele no palco é motivo para a platéia ir ao delírio. Porém, tudo o que fazia era uma revelação natural dele mesmo. Não havia arte em sua apresentação. Ele se transformava em motivo único para atrair o público. Quando ainda pequeno, ao brincar com seus amiguinhos, já se revelava nele o futuro polichinelo. A natureza o fizera assim dotando–o de duas corcundas, uma nas costas e outra no peito, O seu interior, a sua alma, ao contrário, eram belas . Ninguém era melhor do que ele em relação a seus puros sentimentos e sua inteligência. O teatro era o seu mundo ideal, o seu lugar preferido. Lá, ele podia brilhar e ser o melhor de todos. Mas, se fosse belo teria sido certamente o melhor ator trágico de todos os tempos. Sua alma era agraciada com o heróico, o grande, no entanto, ele não passava de um triste e simples polichinelo. Até mesmo sua dor, sua melancolia aumentavam a receptividade do público que o aplaudia grandemente. A adorável Colombina era gentil e boa com ele, mas preferiu se casar com o Arlequim. Teria sido motivo de muitas críticas se a Bela tivesse se casado com a Fera. Quando Polichinelo estava triste e inconsolável, a Colombina era a única pessoa que podia fazê-lo sorrir. Ela sempre começava assim: ficava melancólica como ele, ia ficando mais quieta, tristonha para depois ir mudando sua fisionomia, da tristeza para a alegria, para o riso, para a gargalhada até arrancar dele uma gargalhada. Ai ela dizia:

- Sabe o que acontece com você? Você está apaixonado!
- Imagine o Cupido e eu… seríamos imbatíveis!
- Está certo, mas não brinque! Sei que você está apaixonado… sua paixão secreta sou eu.

Como tudo deveria acabar em risada;o Polichinelo riu, deu duas cambalhotas e a tristeza e melancolia foram embora.
E, no entanto, ela havia falado a verdade, ele a amava, amava-a tanto quanto a arte , a plateia e o palco.
No dia de casamento da Colombina, ele se tornou a figura mais brilhante, mais feliz, mas à noite, em seu quarto, ele chorava, se contorcia e deixava toda sua dor aparecer. Se o público o tivesse visto assim, então o aplaudiria.
Há alguns dias atrás, a Colombina morreu No dia do enterro, Arlequim foi dispensado de subir ao palco; todos se compadeciam com a dor daquele pobre viúvo. O diretor tinha que substituí-lo: ninguém melhor do que Polichinelo. Nessa noite ele foi magnífico. Fez o melhor. O público o aplaudia e gritava: Bravo…Bravíssimo! Nessa noite Polichinelo foi chamado ao palco muitas vezes. Todos consideraram que aquela havia sido sua melhor apresentação. Quando o espetáculo acabou, eu vi aquele homem feio e melancólico deixando o teatro e indo para o cemitério. As flores que ele havia deixado no túmulo da Colombina, haviam murchado. Ali, sobre a laje fria, ele sentou–se; o rosto apoiado nas mãos olhando para o alto, olhando para mim. Que bela cena para ser eternizada por um pintor. O certo é que se seu público o visse assim, certamente gritaria: Bravo…Bravíssimo!Bravo…Bravíssimo, Polichinelo!

© Todos os direitos reservados a H.C Andersen Institutte ®

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