Na mídia, em anúncios e todas as outras mídias sociais (Facebook, Instagram etc) há muitas mães felizes celebrando com filhos, netos e cônjuges o dia dedicado a elas.
É ótimo que isso ocupe tanto espaço público. Em muitas famílias, as mães são o ponto central da família. Agora que a Virgem Maria não é tão celebrada na Dinamarca, é bom celebrar as mães da maneira como cada um de nós escolher. Porque não há duas mães iguais.
Talvez em um discurso no Dia das Mães, alguém mencione o número crescente de tarefas para as mães em nossa sociedade cada vez mais complicada. Provavelmente alguém também falará sobre a sobrecarga de trabalho no domingo. Atualmente, poucas pessoas têm empregados, lavadeiras e outros ajudantes para se responsabilizarem pelo serviço da casa. Em vez disso, há máquinas para cuidar, encher, programar e esvaziar. A pressão física sobre homens e mulheres foi substituída em grande parte pela pressão mental.
Mas nem tudo é fácil para as mães de hoje, assim como não foi para as de ontem. Há também as mães doentes, as mães deficientes, as mães que perderam maridos e filhos em guerras e acidentes. Há as mães sem teto, as mães fracassadas e as mães esquecidas. Há as mães que morreram durante o parto, as mães que tiveram abortos espontâneos e as mães solo. Também devemos nos lembrar delas quando comemoramos o Dia das Mães.
Podemos escolher olhar para trás e ver uma delas. A mãe de Hans Christian Andersen. Ela foi batizada como Anne Marie Andersdatter. Não se sabe com certeza quando e onde ela nasceu. Provavelmente por volta de 1775, perto ou em Odense. Ela se tornou empregada doméstica em Odense. Primeiro ela foi registrada por Madame Ibsen, depois com o comerciante Anders Jensen Bircherod e, finalmente, com o inspetor de estradas H. S. Selchier.
Ela escreveu seu nome de várias maneiras nas cartas encontradas após sua morte e, anos depois entre o acervo de Andersen.
"Maria Gunderses" (28?) de outubro de 1822,
"Anne Marige Gonnesen", 2 de novembro de 1822,
"Maria, sl. Jørgensen", 12 de dezembro de 1822,
"Anne Marie Jørgensen", 27 de maio de 1823,
"Ane Marie Andersen" em 23 de agosto de 1823, 12 de setembro de 1823 e 14 de julho de 1824,
"Anne Marie" em 2 de fevereiro de 1825,
"M." 3 de maio de 1827,
"Sua mãe fiel, amorosa e terna" em 13 de outubro de 1827,
"Marie" em 21 de maio de 1829 e 12 de setembro de 1829,
"Marie Jørgensen" em 5 de dezembro de 1829,
"Anne Maria" em 11 de março de 1829,
"Marie" em 2 de abril de 1830 e 25 de setembro de 1830,
"Marie Jørgensen" em 22 de dezembro de 1830 e 16 de julho de 1831,
"Ane Marie Jørgensen" em 31 de agosto de 1831,
"Anne Marie Andersen" em 14 de dezembro de 1831,
"Marie Jørgensen" em 15 de fevereiro de 1832,
"Anne Marie Andersen" em 17 de maio de 1832 e
"Marie Jørgensen" em 19 de dezembro de 1832 e 27 de fevereiro de 1833.
A.M. Anders Datter também é uma assinatura usada pela mãe em 17 de dezembro de 1823 em um documento.
Hans Christian Andersen se refere a ela de uma forma completamente diferente: "Skomagerenken N. A viúva de Jørgensen, Ana Maria". Também fica claro, pela ortografia das cartas, que estamos em uma época anterior ao estabelecimento de convenções de escrita fixa e práticas ortográficas.
A mãe de Hans Christian Andersen deu à luz uma filha em 22 de setembro de 1799, que foi batizada com o nome de Karen Marie. Ela morreu em 1846, e a torna meia-irmã de Hans Christian Andersen. Ela nasceu fora do casamento. Seu pai era Daniel Jørgensen Rosenvinge ou Rosenvind. Ele era um ceramista profissional.
Em 2 de fevereiro de 1805, Anne Maria Andersdatter se casou com Hans Andersen, um sapateiro artesanal nascido em 1782. Na época do casamento, ela estava grávida de H. C. Andersen, que nasceu dois meses depois, em 2 de abril de 1805. Hans Andersen morreu em 26 de abril de 1816.
A mãe de Hans Christian Andersen se casou pela segunda vez em 8 de julho de 1818 com Niels Jørgensen Gundersen, que morreu alguns anos depois, em 4 de junho de 1822. Hans Christian Andersen não se dava muito bem com ele, e acredita-se que esse seja um dos motivos pelos quais ele foi para Copenhague em setembro de 1819, alguns meses após sua confirmação na Catedral de Odense.
Quando seu segundo marido morreu, ela teve que ganhar a vida sozinha. Ela fez isso lavando roupas para pessoas mais ricas que podiam pagar por esse trabalho. Entre outras coisas, ela fazia faxina regularmente para o Castelo de Odense. Era um trabalho árduo e frio, ficar no rio Odense lavando roupa suja, vindas das casas da cidade, pois durante a maior parte do ano fazia muito frio a ponto de seu corpo ficar congelado. No conto de fadas " Ela não era boa ", de 1852, o escritor de contos de fadas descreveu seu destino difícil, bem disfarçado, muito sutilmente, como de costume, quando suas próprias experiências eram usadas na literatura. Ela era boa o suficiente para Hans Christian Andersen.
A voz da mãe
Nós admiradores e leitores de H. C. Andersen, somos contemplados com centenas de cartas de e para Hans Christian Andersen. Entre essas muitas cartas estão quase 30 de sua mãe para Hans Christian Andersen nos anos entre 1822 e 1833. Ou seja, desde o ano em que ela ficou viúva pela segunda vez até o ano de sua morte.
Hans Christian Andersen é informado da morte de sua mãe em uma carta do Conselheiro Collin. Em seu diário, em 16 de dezembro de 1833, ele escreve: "Há uma carta do velho Collin, minha mãe está morta, ele disse: Deus, eu Te agradeço! Essa foi minha primeira reação, agora ela acabou com sua angústia, que eu não pude aliviar, mas não consigo me acostumar com a ideia de estar tão completamente sozinho, sem uma única pessoa que me ame pelo laço de sangue!"
Sua mãe repete, incansavelmente, a Hans Christian Andersen seu amor por ele. Não há dúvida quanto a isso. Como ela era semianalfabeta, ela pedia que outros a ajudassem nessa missão. Ela ia ditando e alguém registrava suas falas. Os diferentes escritores organizavam o conteúdo à sua maneira. Mas também é um tema recorrente o fato de a mãe não ser, de forma alguma, uma mulher altamente instruída. Ela frequentemente escreve dizendo que sente falta de cartas ou que está feliz com uma carta que recebeu e quer outra. O mesmo se aplica às visitas - ela as aguardava com ansiedade e esperava por elas.
Um tema comum em suas cartas é que ela vivia em profunda pobreza. Ela implora por dinheiro e agradecia sempre pelo dinheiro que Hans Christian Andersen lhe enviava. Hans Christian Andersen geralmente enviava o dinheiro por meio de outras pessoas. Provavelmente para evitar que ela usasse o dinheiro para comprar bebida. Ela pedia a ele que enviasse o dinheiro diretamente para ela, porque tinha necessidade de comprar algumas peças de roupa e somente ela poderia fazer isso. Novamente H. C. Andersen enviava o dinheiro para alguém e pedia que comprasse o que sua mãe precisasse. O descontentamento dela era muito grande e, certa vez, chegou a dizer, em uma carta, que o pijama que compraram para ela foi o pior de toda sua vida. Ela pedia dinheiro para tudo, inclusive para saldar dívidas antigas e para a Igreja, de forma que ela pudesse comungar. Naquela época a Igreja luterana era muito pobre, como de resto toda a Dinamarca e, para que você pudesse comungar, você precisaria pagar pelo vinho que iria receber em um pequeno cálice, na hora da comunhão.
As cartas, escritas no início da vida profissional de escritor de Andersen, também descrevem comentários positivos de leitores em Odense, que nem sempre compravam seus livros, mas pediam emprestados de outros que podiam comprar. Além disso, a mãe mandava notícias de Odense, especialmente sobre pessoas que ambos conheciam. Não são poucas as mortes mencionadas nas cartas.
As cartas de Andersen para sua mãe são mencionadas nos diários do autor, mas apenas algumas puderam ser coletadas a partir de 1831. Podemos adivinhar o conteúdo de algumas das outras com base nas cartas de resposta e nas cartas às quais ela responde, juntamente com os diários e outras fontes. Mas é um trabalho muito mais de adivinhação e imaginação.
Andersen, sem dúvida, tinha um relacionamento ambivalente com sua mãe. O vínculo maternal existia, mas não era muito forte. Como outras crianças de mãe ou pai alcoólatras, ele tinha que agir como adulto em muitas situações. Ele não tinha uma mãe que o pudesse aconselhar em questões mais sérias. No conto de fadas "Ela não era boa", sua vida e seus atos são defendidos e, embora ela não fosse boa para a burguesia de Odense, que se enchia de vinhos finos, ela era boa na defesa que Andersen faz dela, e essa defesa inclui o julgamento positivo de Deus sobre ela.
A vida também pode ser difícil para as mães. Hans Christian Andersen entendia isso, assim como entendia e escrevia gentilmente sobre a vida difícil e os lados sombrios da sociedade contemporânea.
O local onde a mãe de H. C. Andersen lavava roupa, reconstruído é uma das paradas obrigatórias para aqueles que, em excursão, visitam os lugares icônicos em Odense. Esse é um deles.
Fontes: Banco de dados de cartas, SDU – Syddansk Universitet - DK
H. C. Andersen's Mother, A Collection of Letters - fornecido pelo diretor do museu Svend Larsen, Rasmus Hansens Boghandel, Odense 1947
Autor:
Niels Jørgen M. da C. S. Langkilde
Ilustração:
Public
Fonte:
https://institutohcandersen.com/
Contribuição:
Por
Niels Jørgen Langkilde, Mestre em Literatura, Instituto Hans Christian Andersen;
Tradução de Ana Maria Langkilde, Doutora em Literatura;